Estava sem fazer nada, deitada no sofá e resolvi olhar as redes sociais. Me deparo com um comentário que me chamou atenção. Um rapaz, aparentando ter uns 30 anos, publicou um texto sobre perda de tempo no mercado. Dizia que, sempre que ia a sessão de hortifruti, via algumas mulheres tirando o excesso de cascas das cabeças de alho antes de pesar. Ele ironizou e debochou dessas mulheres. Afinal, quanto elas conseguiriam economizar tirando cascas secas dos alhos? Certamente não o bastante para compensar o tempo que elas perdiam descascando aquele monte de alho!
O post me chamou atenção porque eu sou uma dessas mulheres que tira a casca do alho, mas eu nunca havia pensado em fazer isso para economizar no peso. Na verdade, eu faço porque algumas cabeças tem dentes com algum tipo de doença que faz o alho secar, parece um fungo. Já aconteceu comigo, de levar o alho e ao usar ter que jogar fora por estar contaminado. Nos comentários, várias pessoas diziam pra ele que faziam isso por esse mesmo motivo, não para economizar na pesagem. Então ele diz que faz sentindo, que não tinha pensado por esse lado.
Ele interagiu com o mundo, observou algo desconhecido, formulou uma hipótese com base em suas experiências pessoais e desenvolveu uma atitude de menosprezo em relação a um comportamento que só existia na imaginação dele. Então, algo que poderia existir somente dentro dele, ganhou voz, graças a internet.
Esse texto não é sobre alhos ou bugalhos, mas uma análise de como se forma o preconceito.
Já dizia Caetano Veloso, na música Sampa, aquela da esquina da Ipiranga com a São João: “É que narciso acha feio o que não é espelho”. Acho que se fosse fazer uma tatuagem, seria com essa frase. As pessoas estão o tempo todo voltadas para si, olham para outras somente para buscar validação. Àquelas que tem comportamentos e pensamentos parecidos com os meus, me validam. Às que não tem, só podem estar erradas! Sim, isso é verdade há muito tempo, foi verdade na juventude de Caetano Veloso e é ainda mais forte nos tempos atuais. Os próprios algoritmos das redes sociais são programados para nos ofertar mais do mesmo. Se eu gosto de maçãs, ele me cerca de propagandas de produtos com maçãs, vídeos com maçãs, receitas de maçãs...
Ele também conecta pessoas com pensamentos preconceituosos. Então pessoas de várias partes do mundo com esse pensamento podem se juntar, se validarem, ganharem força, pois ao reconhecer que outras pessoas também pensam como ele, não pode ser tão errado assim. Então ele passa a viver somente aquela realidade, todos os que conhece acham a mesma coisa que ele. O pensamento vira um sussurro e aos poucos um grito, de um, uma multidão.
O rapaz do post do alho, encontrou rechaço em vez de validação. Mas será que ele entendeu a dinâmica que o levou a concluir e produzir o post? Ou quais serão as outras conclusões que ele e muitos outros estão tendo sobre os mais variados assuntos?
Precisamos ser rechaço. Precisamos ser informação. Precisamos ser reflexão sincera. Quais julgamentos fazemos de forma precipitada?
Excelente post! Adorei !!!😍 Que nós percebamos assim como o rapaz, nossas precipitações ; a realidade tem de se sobrepor a percepção.