Os fãs do Guia do Mochileiro das Galáxias, clássico de Douglas Adams estão me corrigindo agora. Afinal, no seu livro mais famoso, perguntam a um supercomputador, o Pensamento Profundo, qual é essa resposta para a vida, o universo e tudo mais, e ele, após calcular por 7,5 milhões de anos, responde que é 42! Então de onde eu tirei a ideia de que a resposta é 44?
Muitos de nós autistas aprendemos desde cedo a tentar nos encaixar em comportamentos tidos como normais. A esse método de fingir um sentimento ou uma reação, chamamos de masking, ou mascaramento em português. Esse é um comportamento prejudicial, pois apenas fingimos que estamos bem, quando por dentro estamos muito mal. Com o tempo, esses sentimentos sufocados vão ficando mais fortes e intensos e vamos ficando extremamente sobrecarregados. Alguns tem o meltdown, ou em português, explosão, pois esses sentimentos transbordam com força, causando crises de choro, agressividade, gritos. Outros tem o shutdown, ou implosão, que é uma crise para dentro, é como se a gente se desconectasse do mundo exterior e não tivesse domínio nem sobre nosso próprio corpo ou mente.
Conforme vão ficando adultos, os autistas sem diagnóstico vão tendo cada vez mais crises como essas. Até que alguns conseguem a resposta: Sou Autista! Logo ao entrar nas comunidades, conhecem esses conceitos que expliquei acima, masking, shutdown, meltdown. Também vão descobrindo algumas características típicas do autismo com a rigidez cognitiva que acarreta uma baixa tolerância a frustração e um excesso de apego a rotinas. E, decidem, de forma bem acertada, não mais fazer masking.
Essa também é uma tendência dos autistas. Temos dificuldade de achar um meio termo, ou é 8 ou 80!
Só que quanto mais perto do meio termo, do 44, a gente chegar, mais vamos ter qualidade de vida.
De forma nenhuma estou recomendando o mascaramento das suas emoções, mas a gente não pode confundir o masking com gerenciamento emocional.
O mascaramento serve somente para quem está do lado de fora. Você está sofrendo, mas finge que está tudo bem. Mas também, sofrer por dentro e distribuir patadas e agressividade a todos em volta e exigir que elas continuem te tratando bem e sendo receptivas e empáticas porque é dever delas te incluir, também não é o caminho. Nas duas opções você continua sofrendo e perdendo cada vez mais qualidade de vida. Então qual o caminho? Qual seria o 44?
Eu tenho uma baixa tolerância a frustração. Eu imagino o cenário na minha cabeça e se ele não sai como o planejado isso me abala. Uma coisa simples, como comprar uma marca de biscoito específica e não encontrar no supermercado me fazia entrar em crise imediata. Eu até perdia o rumo de casa. Ficava extremamente agressiva com as pessoas. Eram no mínimo 3 dias de crises, angústias, ansiedade. Porém, eu percebi que isso me fazia mal, e comecei a trabalhar em terapia. Fui aprendendo técnicas para gerenciar minhas expectativas. No caso do supermercado, não vou mais comprar uma coisa específica, eu sempre escolho mentalmente 3 produtos que eu quero e internalizo que se não tiver o primeiro da lista eu compro os outros 2. Pois mesmo perdendo o produto que eu queria mais, eu tenho a impressão que continuo ganhando. Óbvio que ainda sinto um desconforto grande, mas como eu já decidi antes o que fazer, consigo gerenciar minhas emoções e sem precisar mascarar que estou desconfortável.
A diferença entre gerenciar emoções e o masking está no objetivo. O objetivo da terapia para autistas é aumentar a nossa qualidade de vida, diminuindo as nossas crises e nos ensinando a lidar com as situações do dia a dia.
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